A relação da música com a medicina também é longínqua. Remonta, provavelmente, à civilização egípcia a origem dos primeiros escritos sobre a acção da música no corpo humano: os papiros médicos descobertos pelo antropólogo inglês Flandres Petrie, em Kahum (1899), de c. 1500 a.C., mencionam a influência benéfica da música na fertilidade da mulher . Também são referências importantes as lendas da mitologia grega (e outros relatos) que enumeram episódios sobre o poder calmante e terapêutico da música: Homero afirma que Aquiles foi encontrado na sua tenda tocando em uma magnífica lira e expurgando a sua cólera ; Orfeu, que aprendeu a arte com o próprio Apolo, deus da música e da medicina, ao “tanger a sua lira melodiosa, arrastava as árvores e conduzia os animais selvagens da floresta” ; Empédocles (482 - 430 a.C.) “era capaz de apaziguar paixões (…) foi o que fez a um jovem furioso, cantando versos da Odisseia” . Os Pitagóricos e os Coribantes usavam a música para expulsar os agentes causadores da doença e restabelecer a harmonia entre corpo e alma e Demócrito (c.460-370 a.C.) sustentava que muitas doenças poderiam ser curadas através de sons melodiosos de uma flauta .
No primeiro século d.C. o médico grego Asclepíades de Bitínia (c.124 – 40 a.C.) empregava a música para acalmar a excitação dos alienados e usava a trompete para curar a ciática. Esta tradição perdurou até à era cristã – e.g., Galeno (131-201 a.C.), também médico, acreditava que a música tinha o poder de combater a depressão e os estados de tristeza .
No Antigo Testamento atribuíam-se à música poderes idênticos:“Todas as vezes que o espírito de Deus o acometia, David tomava a lira e tocava; então Saul se acalmava, sentia-se melhor e o mau espírito o deixava” (Bíblia de Jerusalém, Samuel 16, 23).Já na Idade Média, em De Institutione musica, Boécio (480-524), que também se ocupou da influência da música sobre os estados violentos, refere curas efectuadas por Pitágoras, a um alcoólico, e por Empédocles, a um louco, e como os pitagóricos induziam o sono através de melodias doces . Na verdade, este tipo de relato encontra-se com abundância ao longo da história: Benenzon cita fontes medievais, tanto árabes como judias, “onde se narra com frequência como se chamavam os músicos para aliviar as dores dos enfermos no hospital” . No século XV, o musicógrafo flamengo Tinctoris (1445-1511) afirmava que um dos objectivos da música seria o de curar as doenças . Ainda nesta época, salienta-se o trabalho de Marsílio Ficino (1433-99) que, de forma pioneira, preconizou a musicoterapia activa ao prescrever que: “O homem melancólico execu¬tará, e às vezes inventará ele mesmo, os ares musicais (…) ele cantará e tangerá a lira” . Nesta óptica, a música deixaria de ser uma medicação externa e passaria a fazer parte do processo terapêutico.
Em 1584, o naturalista italiano Giambattista della Porta (1537-1615) escrevia, na sua obra Magiae naturalis , que o som advindo de instrumentos musicais feitos da mesma madeira de plantas medicinais produzia os mesmos efeitos terapêuticos: “as plantas de madeira de álamo, por exemplo, seriam efica¬zes contra as dores de ciática, as de madeira de heléboro contra as enfermidades nervosas, enquanto que os instrumentos feitos com fibra da planta de rícino provocariam efeitos purgativos” . Athanasius Kircher (c.1602-1680), no século XVII, recomendava o uso terapêutico da música, depois de ter experimentado em si os seus efeitos.
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